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Carros elétricos chineses: valem a pena?

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Carros elétricos chineses: valem a pena?

Carros elétricos chineses: valem a pena?

Introdução

A pergunta deixou de ser “quando” e passou a ser “a quem vamos comprar”. Em 2025, mais de um quinto dos ligeiros de passageiros matriculados em Portugal já são 100 % eléctricos, e a BYD ultrapassou a Tesla nas vendas de Janeiro, num mercado em ligeira retracção geral. Esta inversão de liderança é apenas o rosto mais visível de uma mudança tectónica: os fabricantes chineses deixaram de ser fornecedores discretos de componentes para se tornarem protagonistas globais.

Nos corredores de concessionários em Lisboa, Braga ou Faro, modelos como o BYD Dolphin, o MG4 ou o Zeekr X disputam a atenção de clientes habituados a marcas europeias. A promessa é sedutora: preços até 30 % mais baixos, autonomia competitiva e equipamento “premium” de série. Mas será que o negócio compensa a longo prazo? Esta reportagem analisa dados de mercado, avaliações técnicas, impacto ambiental, garantias, rede de assistência e políticas comerciais para responder, de forma objectiva, se vale a pena pôr um elétrico chinês na garagem portuguesa.

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Panorama global dos fabricantes chineses

A China exportou 1,55 milhões de veículos eléctricos em 2024, mais 63 % do que em 2023, mantendo BYD e SAIC (dona da MG) no “top‑5” mundial. A ofensiva europeia começou em 2022, mas ganhou velocidade quando a União Europeia aplicou direitos anti‑subvenções provisórios até 35,3 % sobre BEV vindos da China, medida ainda em vigor enquanto decorre a investigação definitiva.

Em Espanha, a venda de elétricos saltou 54 % no primeiro quadrimestre de 2025, enquanto as entregas da Tesla caíram 17 %, pressionadas por BYD, MG e Omoda, cujas vendas cresceram 644 %, 80 % e 346 % respectivamente. Estes números ajudam a explicar por que motivo os construtores chineses estão dispostos a absorver taxas aduaneiras: o volume europeu tornou‑se estratégico, não apenas pela margem, mas pelo prestígio de vencer em casa dos rivais históricos.

A realidade portuguesa em números

Segundo os dados da ACAP, o mercado BEV nacional cresceu 14 % entre Janeiro e Julho de 2024, com 22 531 unidades matriculadas. Esse ritmo acelerou no Inverno: em Janeiro de 2025, os elétricos foram já 22,5 % de todas as vendas de ligeiros, e a BYD liderou com 392 registos, versus 369 da Tesla.

BYD e MG, as novas locomotivas

  • BYD: registo de 437 matriculações até Abril de 2025, mais 188 % face a 2024.
  • MG4: o compacto feito na China mas sob controlo da SAIC mantém‑se no “top‑3” de elétricos vendidos em Portugal desde 2023.

Nio, Xpeng e Zeekr ainda têm distribuição limitada, mas o interesse é palpável: o Zeekr X foi o elétrico mais seguro avaliado pelo Euro NCAP em 2024.

Principais marcas e modelos em destaque

BYD

A marca de Shenzhen opera em Portugal desde 2023 através da Caetano Tec, com concessionários de Braga a Faro. caetanoretail.pt O BYD Dolphin custa desde 29 990 €, preço confirmado em concessionário oficial. O SUV BYD Atto 3 arranca nos 36 220 €, oferecendo bateria LFP “Blade” de 60 kWh.

A tecnologia de bateria Blade, com células prismáticas LFP dispostas como lâminas, promete maior resistência a incêndios e vida útil prolongada.

MG

O MG4 Electric, a partir de 32 000 €, oferece 7 anos ou 150 000 km de garantia, cobrindo também a bateria. A rede MG conta com mais de quinze pontos de venda em Portugal, com expansão contínua desde 2022. escapelivre.com

Nio, Xpeng e Zeekr

A Nio aposta no ET5 Touring, com baterias de 74 kWh ou 100 kWh e serviço de troca ultra‑rápida em cinco minutos. Xpeng introduziu o modelo G6, enquanto a Zeekr, do grupo Geely, ganhou holofotes pelo recorde de segurança do Zeekr X.

Estrutura de preços e concorrência

Estrutura de preços e concorrência
Estrutura de preços e concorrência

† Diferença baseada em preços de tabela antes de incentivos.

Os valores confirmam um desconto médio de 20 %–30 % face aos rivais europeus ou coreanos, explicando o interesse do consumidor. Contudo, o preço inicial é apenas uma peça do “puzzle”.

Segurança e fiabilidade

A Euro NCAP atribuiu nota máxima de cinco estrelas ao Zeekr X e quatro estrelas ao BYD Atto 3, mas considerou “não recomendado” o sistema de assistência de auto‑estrada deste último. MG4 e Nio ET5 também alcançaram cinco estrelas em 2023, reforçando que os produtos chineses já competem em segurança.

Garantias

  • BYD: 6 anos ou 150 000 km de garantia total; bateria 8 anos/200 000 km.
  • MG: 7 anos ou 150 000 km de garantia total e bateria.

Estas coberturas superam a média europeia de 3 anos, embora incluam exclusões (multimédia, cabos, etc.).

Rede de assistência e peças

A BYD opera, via Caetano Tec, stands em Lisboa, Porto, Gaia, Cascais e Setúbal, com oficinas certificadas. caetanoretail.pt A MG tem pontos de venda de norte a sul, parceria de renting com a Locarent anunciada em Maio de 2025 para reforçar frotas. fleetmagazine.pt

A capilaridade ainda é inferior à das marcas tradicionais, mas supera Tesla em número de oficinas físicas no território continental.

Sustentabilidade: pegada real

Produzir uma bateria na China emite, em média, 70 % mais CO₂ do que uma equivalente fabricada na UE com energia renovável. A exportação por navio acrescenta 2 % a 3 % ao ciclo de vida das emissões, mas mesmo assim um BEV chinês compensa a pegada extra em cerca de 18 000 km, quando carregado com a actual mistura eléctrica portuguesa (66 % renovável em 2024).

Entretanto, a Europa acelera na reciclagem de baterias, conseguindo reduzir 70 % das emissões no processo de refabrico, valor que a China ainda não iguala.

Política comercial e incertezas fiscais

A Comissão Europeia deve decidir até Outubro de 2025 se torna definitivas as taxas anti‑subvenções. Caso avancem, o BYD Dolphin poderá subir 4 000 € a 5 000 €, segundo analistas do setor. O governo português mantém, para já, o incentivo de 4 000 € por BEV abaixo de 62 500 €, suavizando parte do impacto.

Custo total de propriedade (TCO)

Considerando um utilizador que percorra 20 000 km/ano durante oito anos, com eletricidade doméstica a 0,18 €/kWh, o TCO do BYD Dolphin é 0,28 €/km, contra 0,35 €/km para um Renault Zoe usado como referência. A poupança advém de:

  1. Preço de aquisição — –6 000 € após incentivo.
  2. Energia — consumo real médio de 15 kWh/100 km.
  3. Manutenção — 35 % mais barata face a motores térmicos, graças à menor complexidade mecânica.

O valor residual, ainda uma incógnita, poderá penalizar até 10 % caso a marca recue na UE ou as tarifas disparem.

Experiência de condução e software

Ensaios nacionais apontam bom equilíbrio de chassis no MG4 e conforto acima da média citadina no BYD Dolphin. Críticas mais frequentes: conectividade limitada (Apple CarPlay retardado), tradução imperfeita da interface e falhas pontuais nos alertas ADAS. A rápida cadência de “over‑the‑air updates” compensa parte destes percalços.

Perspectiva 2025‑2030

A curto prazo, BYD planeia abrir mais cinco pontos de venda em Portugal até final de 2025, acompanhando o objectivo ibérico de cem concessionários. cadenaser.com SAIC‑MG confirma fábrica de baterias em Espanha para reduzir dependência da Ásia, enquanto Nio avalia uma fábrica de troca de baterias na Galiza.

Se os construtores chineses consolidarem cadeias de abastecimento mais ecológicas na Europa, a vantagem de custo pode diminuir, mas a percepção de qualidade e a proximidade da assistência aumentarão.

Conclusão: valem mesmo a pena?

Sim, mas com notas de rodapé.

  • Preço e garantia jogam claramente a favor dos modelos chineses.
  • Segurança evoluiu ao ponto de igualar ou superar rivais europeus em vários testes.
  • Rede de assistência ainda não cobre todo o país, mas cresce rapidamente e já disponibiliza oficinas autorizadas fora dos grandes centros.
  • Sustentabilidade continua dependente de melhorias na produção de baterias; quem percorre muitos quilómetros anula rapidamente o “défice” de CO₂ incorporado.
  • Risco regulatório (tarifas, percepções geopolíticas) é o principal factor de incerteza a médio prazo.

Para o consumidor português que procura um BEV acessível, equipado e com garantia robusta, um BYD Dolphin ou um MG4 é, hoje, a escolha mais racional. Quem valoriza tradição de marca, valor residual ou integração profunda com o ecossistema europeu pode preferir esperar pelos eléctricos feitos na UE. Afinal, a revolução elétrica já chegou — mas continua a ser escrita, quilómetro após quilómetro.