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IVA na compra e venda de carros: discriminado ou dedutível?

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IVA na compra e venda de carros: discriminado ou dedutível?

IVA na compra e venda de carros: discriminado ou dedutível?

O Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) é um dos temas mais sensíveis — e por vezes mais mal-compreendidos — no sector automóvel português. Sempre que um veículo muda de mãos, seja numa aquisição directa a um concessionário ou numa revenda entre particulares mediada por stands, coloca-se a mesma questão: o IVA deve ser discriminado na factura ou pode ser deduzido?A resposta não é binária. Depende do tipo de viatura, do enquadramento do sujeito passivo, do destino dado ao veículo e, sobretudo, do regime fiscal escolhido ou imposto pela lei.

Ao longo das próximas páginas entrevistamos contabilistas certificados, analisamos pareceres recentes da Autoridade Tributária e mergulhamos nos diplomas que regulam o regime geral do IVA, o Regime Especial da Margem (REM) e as isenções específicas para eléctricos, híbridos plug-in e viaturas bi-fuel. O objectivo é simples: oferecer um manual prático, mas juridicamente sólido, para que empresas e consumidores tomem decisões informadas em 2025.

Contexto legal do iva

O Código do IVA (CIVA) continua a ser a espinha-dorsal, complementado pelo Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI) e pelo Decreto-Lei 199/96, que criou o REM para bens em segunda mão. O Orçamento do Estado para 2025 introduziu, ainda, novos limiares de custo de aquisiçãorelevantes para a dedução em viaturas de passageiros — matéria que exploraremos adiante.OCCpaulomarques-saberfazer-fazersaber.blogs.sapo.pt

Compra de viaturas: quando o IVA é dedutível?

Viaturas de turismo versus viaturas comerciais

  • Viatura de turismo — regra geral, o IVA não é dedutível (arts. 19.º e 20.º do CIVA).
  • Viatura comercial até 3 lugares — IVA dedutível se o veículo for usado exclusivamentena actividade tributada do sujeito passivo (art. 21.º n.º 1 al. a) do CIVA).
  • Uso misto — qualquer utilização pessoal, ainda que esporádica, inviabiliza a dedução total. Neste caso, o imposto deve ser discriminadona factura e suportado como custo.Caetano Retail

Limites de custo de aquisição em 2025

  • Carro eléctrico 100 %:limite de 62 500 € (valor sem IVA) com dedução de 100 %.
  • Híbrido plug-in:limite de 50 000 € com dedução de 100 %.
  • Bi-fuel (GPL/GNV):limite de 37 500 € com dedução de 50 %.
Estes limites funcionam como gatekeepers: incentivam a mobilidade sustentável e travam a dedução integral em veículos premium de valor muito elevado.

Porque existem limites?

Os tetos funcionam como gatekeepers: premiam a aquisição de viaturas mais sustentáveis e evitam que veículos premium de valor muito elevado beneficiem de deduções integrais que o legislador considera injustificadas.

Actividades específicas com dedução integral

  1. Concessionários e stands (revenda).
  2. Transporte público de passageiros — táxi, TVDE, rent-a-car, veículos fúnebres.
  3. Transporte escolarou de crianças, facturado com IVA.

Nestes casos, a viatura é um instrumento de trabalho, pelo que o IVA suportado é tradicionalmente dedutível, desde que a factura identifique correctamente o enquadramento. Caetano Retail

IVA na compra e venda de carros: discriminado ou dedutível?
IVA na compra e venda de carros: discriminado ou dedutível?

O IVA na venda: regime geral ou regime da margem?

Quando uma empresa decide revender um automóvel, dispõe de dois caminhos:

  1. Regime geral — o IVA incide sobre o preço total.
  2. Regime Especial da Margem — o IVA é calculado apenas sobre a diferença entre preço de compra e preço de venda (a “margem”).

Requisitos para aplicar o REM

  • O vendedor tem de ser sujeito passivo revendedor.
  • O veículo tem de ser “bem em segunda mão” (mais de seis meses desde a primeira matrícula emais de 6 000 km).
  • A aquisição inicial não pode ter conferido direito a dedução do IVA.Fleet MagazineOCC

Dedução do IVA na compra e aplicação do REM na venda: é compatível?

Aqui reside um dos equívocos mais comuns. Se o stand deduziuo IVA quando comprou a viatura (por exemplo, a outro sujeito passivo nacional com IVA discriminado), não pode recorrer ao REMquando a revender. A lei impede a coexistência dos dois benefícios para evitar a dupla poupança fiscal — parecer oficial PT28022 da Ordem dos Contabilistas Certificados.OCC

Como se calcula a margem tributável?

Margem = Preço de venda – Preço de compra
Valor tributável = Margem × (100 / 123)
IVA liquidado (23 %) = Valor tributável × 0,23

Exemplo prático: venda a 17 000 €, compra a 10 000 €. Margem = 7 000 €. Valor tributável = 5 691,06 €. IVA = 1 308,24 €.Fleet Magazine

Casuística: eléctricos, híbridos e bi-fuel no REM

Apesar de os limites de dedução incentivarem a mobilidade sustentável, um carro eléctrico revendido em segunda mãopode enquadrar-se no REM se cumprir os critérios de idade e quilometragem. A dedução obtida na compra inicial pelo concessionário, no entanto, continua a impedir a aplicação posterior do REM. O princípio é sempre o mesmo: não há IVA sobre IVA, mas também não há dedução dupla.

IVA intracomunitário e importação

Nos casos em que o stand compra a viatura num Estado-membro e o fornecedor já aplicou o REM local, a aquisição intracomunitária em Portugal não é sujeita a IVA (art. 3.º do DL 199/96). Já se o fornecedor liquidou IVA pelo regime geral, o revendedor português é obrigado a autoliquidar o imposto na declaração periódica, podendo deduzir esse montante se a revenda futura ocorrer também pelo regime geral. Fleet MagazineOCC

Obrigações formais: da factura ao DUA

  1. Factura
    • Identificação clara do regime aplicado (“IVA – regime da margem” ou “IVA 23 % discriminado”).
    • NIF do comprador e do vendedor.
  2. DUA
    • Confirmação do tipo de veículo (mercadorias, passageiros, combustível).
  3. Declaração periódica de IVA
    • Campos 03 e 04 do quadro 06 para o REM.
  4. Conservação de documentos: mínimo de 10 anos, segundo o art. 52.º do CIVA.

Falhas neste circuito podem traduzir-se em correcções de imposto, juros compensatórios e coimas que, em 2025, vão dos 120 € aos 45 000 €, consoante a gravidade.

Tributação autónoma versus dedutibilidade

Mesmo quando o IVA é dedutível, a empresa pode ficar sujeita à tributação autónoma em IRCsobre as despesas com viaturas ligeiras de passageiros. O OE 2025 reduziu as taxas para 8 %, 25 % e 32 %, mas actualizou os escalões de custo de aquisição. Isto significa que optar por um carro eléctrico dentro do limite de 62 500 € pode ser fiscalmente atractivo não só pelo IVA, mas também pela redução da tributação autónoma. paulomarques-saberfazer-fazersaber.blogs.sapo.pt

Casos especiais

Táxi e TVDE

A dedutibilidade do IVA é integral, mas os operadores têm de manter um diário de quilómetrospara comprovar que o veículo é afecto à actividade de transporte remunerado de passageiros.

Rent-a-car

As locadoras podem deduzir integralmente o IVA na compra e nas despesas de manutenção, dado que a actividade é tributada. Na revenda do carro retirado da frota, podem aplicar o REM se não houver dedução prévia na aquisição.

Pessoas com deficiência

Isenção total de IVA na compra de viatura própria, desde que mantida por cinco anos. A venda antes desse prazo gera obrigação de liquidar IVA proporcional. Caetano Retail

Tendências 2025-2030

  • Electrificação — a combinação de dedução de IVA e redução de tributação autónoma torna os eléctricos cada vez mais competitivos.
  • Fiscalização digital — o e-Factura e o SAF-T (PT) dão à AT ferramentas para cruzar dados e detectar deduções indevidas quase em tempo real.
  • Pressão europeia — a revisão da Directiva IVA 2006/112/CE poderá harmonizar o REM a nível da UE, reduzindo arbitragem fiscal entre Estados-membros.

Check-list para quem compra

  1. Exigir factura com indicação do regime.
  2. Confirmar se o IVA está incluído no preço anunciado.
  3. Verificar no DUA a categoria da viatura e o combustível.
  4. Pedir declaração do stand sobre a dedutibilidade (ou não) do IVA.

Check-list para quem revende

  1. Avaliar se a aquisição original permitiu dedução.
  2. Escolher o regime (geral ou margem) antes de emitir a factura.
  3. Documentar preço de compra real, sem custos acessórios.
  4. Arquivar prova de quilometragem e data da primeira matrícula.

Conclusão

A questão “IVA discriminado ou dedutível?” na compra e venda de automóveis não tem uma resposta universal. Depende da matriz tripla veículo–sujeito passivo–regime. Em 2025, o legislador continua a privilegiar carros de menor pegada ambiental, permitindo deduções alargadas a eléctricos e híbridos, mas mantém um apertado controlo sobre o REM para viaturas usadas. Para empresas, a optimização fiscal passa por uma análise holística que inclua IVA, tributação autónoma e custos de financiamento. Para consumidores particulares, a transparência do preço — saber se o IVA já está “na margem” ou se será somado — é essencial para comparar propostas.

Em todos os casos, a melhor defesa contra surpresas fiscais é a documentação rigorosa. Um dossier bem montado vale tanto quanto um desconto negociado, porque evita correcções que podem corroer, em poucos anos, o benefício obtido à partida.

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